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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Carlos Alberto Pavan "Jacaré"

Motos não são minha paixão em termos de velocidade,(embora tenha um primo distante várias vezes campeão de motovelocidade chamado Walter "Tucano" Barchi);Mas abrirei uma brecha aqui para lembrar um grande piloto motociclista: rápido,ousado,irreverente;A velocidade e seus efeitos eram o que mais amava;Seu nome era Carlos Alberto Pavan, ou simplesmente,Jacaré;



Nascido em Poços de Caldas, MG em 29 de maio de 1952; Uma infância marcada pela dificuldade : a separação dos pais, a mãe indo para MG; Carlos e o irmão ficam em SP com o pai; a relação entre eles conturbada;
Assim a adolescência de Jacaré foi marcada pela rebeldia;mal se formou no 3° colegial, e aos 16 anos foi arrebatado pela paixão por motos e velocidade;
Começou andando na Mondial de um amigo até conseguir sua primeira moto, uma Norton 500, de fabricação inglesa


Norton 500 cc 1957

Foi graças a seu trabalho como mecânico que conseguiu comprá-la, mas logo aquilo que seria uma triste rotina em sua vida aconteceu: em um acidente durante um "passeio" destruiu a Norton por completo;

Mas outra marca sua era a persistência, e assim aos 20 anos, convence Luiz Latorre a lhe emprestar sua moto, uma Ducati 250 para começar a competir;


Jacaré e a Ducati 250 em Interlagos aos 20 anos, em 1972

Jacaré tem uma estréia promissora, com a moto de Latorre consegue boas posições no campeonato de 1972;
Mas o ano de 1973 guardava seu melhor para Jacaré: Denisio Casarini e Walter "Tucano" Barchi, os dois maiores nomes da motovelocidade da época ( e de todos os tempos),  que corriam pela equipe de Edgard Soares, são contratados pela recém montada equipe oficial da Yamaha;  Edgard,irritado com o fato,diz: - "Vocês pensam que são grandes pilotos, não? Pois eu vou pegar um moleque da rua e fazer dele um campeão !"
O "moleque da rua" foi Jacaré.


Jacaré com a moto de Edgard Soares no inicio de 1973; em pé ao lado, o lendário mecânico Chico Sapão, e a esq, Caiuby Rhormens , presidente da Confederação Brasileira de Motociclismo

A primeira vitória viria no final do ano, com uma  Yamaha TR-3, com o mítico n°46 (n° que se tornou marca registrada de Edgard Soares,já falecido;hoje este n° é a marca de uma concessionária Kasinski em SP)


Jacaré e a Yamaha TR-3 n°46

O ano de 1974 seria o mais importante e vitorioso da carreira de Jacaré; Em fevereiro a temporada se iniciava com a famosa Taça Centauro, disputada por pilotos internacionais e os maiores nomes do país: Jacaré termina em 5° pilotando uma antiquada TR3, atrás apenas do campeão mundial de 1973, Kent Anderson  e dos monstros brasileiros Adu Celso, Denísio Casarini e Walter Tucano Barchi, todos pilotando modernas Yamaha TZ 350 oficiais de fábrica...

Março: as 24 Horas de Interlagos; Edgard prepara uma BMW para a disputa que seria pilotada por Jacaré e  Edmar Ferreira; Jacaré vinha entre as primeiras posições, quando a sina o atinge novamente: uma queda e a mão esquerda fraturada; Edmar assume, e ai Jacaré mostra do que era feito: outro teria ido pra casa, ele não, foi ao hospital, engessa a mão e volta a Interlagos para continuar a disputa;só não terminou a prova devido ao motor da BMW não ter aguentado até o final;


Jacaré pilotando a BMW com a mão fraturada nas 24 Hs de Interlagos,1974

O Campeonato Paulista começa em abril e Jacaré ganha de Edgard uma TZ-350 novinha para competir; E com ela conquista em maio, em dupla com o venezuelano Johnny Ceccoto (que depois competiu na F-1),as 500 Milhas de Interlagos, prova que constava do calendário internacional


Jacaré e a TZ 350 em Interlagos,durante as 500 Milhas 1974

É de Jacaré a primeira vitória oficial do circuito de Goiânia, inaugurado em julho de 1974;

Em agosto conquista por antecipação o Campeonato Paulista e se torna líder isolado do Campeonato Brasileiro;
Em 19 de agosto de 1974, crava seu nome na história de Interlagos, ao vencer a mais veloz prova disputa no Hemisfério Sul, as 200 Milhas de Interlagos no anel externo; 


Jacaré na TZ 350 de n° 4 no antigo anel externo de Interlagos

(após a reforma de 1990, o anel externo foi inutilizado e assim o recorde de velocidade nele para uma moto, é de Jacaré para a eternidade)

Mas correr só nas pistas não satisfazia Jacaré, e isso foi sua ruína : rachas, exibições em avenidas e ruas, acidentes... As broncas de seu chefe Edgard cada vez mais constantes


Jacaré se exibindo em cima de uma moto em plena R Augusta

Faltavam duas provas para o término do campeonato de 1974;Ambas em Goiânia; na primeira delas, após o acidente que vitimou fatalmente  Hélio Gumerato nos treinos, Jacaré chega em 2°, atrás de Edmar Ferreira; bastaria completar a prova seguinte na zona de pontuação para ser campeão; Mas isso não ocorreu: Dias antes, Jacaré sofre um gravíssimo acidente na garupa de um amigo,durante um pega no Elevado Costa e Silva (o "Minhocão).
Jacaré fratura a bacia, fêmur,e rótula direitas e a tíbia esquerda;

O título se fora, juntamente com os patrocinadores, com seu contrato com Edgard... Muitos decretaram que era o fim da carreira de Jacaré...diziam os médicos que ele corria sérios riscos de nunca mais dobrar a perna direita e assim estar definitivamente inutilizado;


Jacaré visivelmente abatido, de muletas, nas 24 Hs de Interlagos em 1975;

1975 começa de modo sombrio diriam muitos... Mas a persistência novamente fez o que parecia impossivel: Jacaré consegue se recuperar e voltar;
Com a ajuda do amigo Manolo, que lhe imprestou uma Kawasaki 900, Jacaré se inscreve nas 200 milhas de Interlagos 1975;
Duas semanas antes da prova porém, outro acidente nas ruas quase põe mesmo um ponto final em tudo: nova queda e uma clavícula fraturada;
Com a mesma ainda em fratura instável, Jacaré está no grid de largada com a Kawasaki,e numa prova de total superação de tudo: da dor física, do abandono,da falta de apoio,Jacaré vence de modo espetacular as 200 milhas na categoria Esporte!


Jacaré com a clavícula quebrada no lugar mais alto do pódio nas 200 milhas de Interlagos 1975

Sua fala no pódio era embargada pela emoção; " Vocês verão, serei outro daqui para frente, mudarei, serei campeão enfim!"

Mas infelizmente o que aconteceu foi diferente: 23 de agosto de 1975, já era madrugada de inverno em São Paulo; Jacaré está a bordo de um Porsche guiado por um amigo, quando passam pela Av Cidade Jardim, uma dos mais refinados endereços de São Paulo, quando por eles passa uma Honda CB 750 Four, ou mais conhecida como ''7 Galo", literalmente voando... o Porsche a alcança num farol, e de relance, Jacaré decide fazer um pega; Empresta outra  Honda 750 de alguém e saem em alta velocidade; Na altura do restaurante Pandoro, aparece um Opala na frente dos dois: Assustado com o ronco aterrorizante da 7 Galo, o motorista do Opala puxa o carro da esquerda para a direita, cortando a trajetória de Jacaré;
E assim. a 150 Km/h Jacaré entra na traseira do Opala, tendo morte instantânea;
Estava tudo acabado; Os sonhos do menino rebelde de Poços de Caldas estavam
mortos;era o triste fim de uma vida marcada pelo entusiasmo;
Seu cortejo fúnebre foi uma das cenas mais marcantes do mundo da velocidade: 2000 motos com cravos vermelhos nos guidões seguindo o carro fúnebre...



A emocionante narrativa da morte de Jacaré pela voz do radialista Hélio Ribeiro




Esse foi o ronco que assustou o motorista do Opala em 23 de agosto de 1975:
o inconfundível 4 em 1 da 750 CB Four "7 Galo"
















segunda-feira, 23 de abril de 2012

Pierre Levegh

Ele tinha tudo para ter passado para a história pelo seu talento, mas infelizmente, ficou como o protagonista do pior acidente da história do automobilismo;
Pierre Levegh nasceu Pierre Eugène Alfred Bouillin, em 22 de dezembro de 1905, em Paris, França

Pierre Levegh

Adotou o nome Levegh em homenagem o tio, pioneiro das corridas, que morreu em um acidente em 1904, um ano antes de seu nascimento;Além de piloto,Levegh também  jogou hockey no gelo e tênis; Mas os carros foram sua grande paixão, e na 1° temporada de F1, em 1950, começou a competir com um Talbot-Lago; A essa época, a mítica prova das 24 hs de Le Mans estava no calendário juntamente com a F-1; com o Talbot, Levegh foi 14° na prova de 1951 e em 1952 abandonou por quebra; em 1953 foi 18° e em 1954 se envolveu em uma batida após 17 horas de corrida;
Mas 1955 prometia; Levegh iria pilotar a maior máquina da época, a Mercedes Benz 300SLR; a versão carenada da W-196 de F-1


A mítica Mercedes 300 SLR de 1955

As 24 hs de LeMans de 1955 tinha tudo para ser uma prova excepcional, com um embate entre a inglesa Jaguar, a italiana Ferrari e a alemã Mercedes, as 3 com seus modelos mais emblemáticos de todos os tempos (pela ordem): D-Type,121 LM e 300 SLR.
A Jaguar tinha como pilotos, o inglês Mike Hawthorn e o novato Ivor Bueb; a Ferrari o grande piloto italiano Eugênio Castellotti,e o americano Phill Hill; a Mercedes trouxe dois carros; um para a dupla Juan Manuel Fangio(ARG) e Stirling Moss(GBR);os maiores pilotos da época e dois dos maiores de todos os tempos; e um para a dupla Jonh Fitch (EUA) e Pierre Levegh.
com 49 anos Levegh via uma chance para se  tornar vitorioso: tinha simplesmente o melhor carro de todos, para quem em 1952 conduziu seu Talbot por 22 horas seguidas sem troca de pilotos e quebrou justamente em 1° lugar, uma vitória era mais que possivel;

As 16 hs do sábado, dia 11 de junho de 1955, começa a prova: Castellotti e sua Ferrari largam em 1°; Fangio e Hawthorn imprimem um ritmo alucinante: chegam a rasgar a grande reta Hunaudières a 300 km/h; mais que uma disputa automobilistica, era uma disputa incurada da 2°Guerra Mundial; Hawthorn estava decidido a impedir que um carro alemão ganhasse de um carro inglês.


Castellotti com a Ferrari n°4, seguido de Hawthorn no Jaguar n°6 e Fangio na Mercedes n°16


Duas horas e meia de prova, volta n°34: Hawthorn está em 1°, seguido de Fangio em sua Mercedes, O Jaguar n°6 está próximo de fazer seu 1° pit stop; Hawthorn decide pisar o máximo que pode para abrir uma vantagem que o permita voltar dos boxes ainda na briga pelo 1° lugar, (algo desnecessário em uma prova com 24 hs de duração);
Ele acelera seu Jaguar ao máximo, e a 100 metros dos boxes, se valendo dos poderosos freios a disco da Girlling, freia repentinamente;Mas havia um detalhe que Hawthorn não considerou:para esta manobra ele ultrapassou um carro mais lento, um Austin-Healey A-100 de  categoria menor(em Le Mans, disputam-se várias classes de automóveis ao mesmo tempo); O Austin guiado por Lance Macklin estava a no máximo 180 km/h e viu a traseira do D-Type crescer a sua frente; sem conseguir frear e para desviar do Jaguar, joga para sua esquerda; apontam as 2 Mercedes na reta a 260 km/h : Levegh que estava levando uma volta dos lideres vinha a frente e Fangio logo atrás; Levegh não consegue desviar do Austin e decola sobre sua traseira: a Mercedes voa sobre a arquibancada;capota inumeras vezes e explode; seus destroços em chamas matam Levegh(que teve o crânio fraturado) e mais 87 espectadores; 79 pessoas ficam feridas; corpos em chamas voam  para a pista diante de fiscais e mecânicos aterrorizados;
Há pânico generalizado; muitos correm para as saidas da arquibancada e morrem pisoteados;
o corpo de Levegh foi achado a 70 metros de onde parou o que sobrou do 300 SLR; o clima no autodrómo é horrendo; Mas o diretor de prova Charles Faroux, na decisão mais criticada e condenada da história, decide que a prova vai proseguir; Alfred Neubauer, o emblemático chefe de equipe da Mercedes vai até os boxes da Jaguar;Em um ato de cavalheiro, diz que vai se retirar da prova e solicita o mesmo ;No entanto,a equipe inglesa decide continuar na prova e vence com Hawthorn; no podio,ele bebe a champagne da vitória,ato que revoltou a França; porém nos boxes, a realidade cai: ele tem uma crise de histeria e diz que não quer pilotar mais; Após a prova,os 4 GPS seguintes são cancelados,incluindo o da Suiça, que baniu as provas de automobilismo para sempre de seu território; A Mercedes Benz se retira das competições para retornar somente 40 anos depois;
Ninguém foi responsabilizado pelo acidente de fato; De modo covarde, alguns insinuaram a culpa para Levegh, que morto não teria defesa.... e assim o "Bispo", como Levegh era conhecido, entrou para a historia; não por sua conduta sempre suave e gentil, não por seu talento, mas por ter se envolvido na maior trágedia já ocorrida nas pistas.


Vídeo com raras imagens da tragédia de Le Mans 1955




A tragédia vista de outro ângulo





domingo, 12 de fevereiro de 2012

Peter Brock

A Austrália é quase um continente a parte; seja por sua dimensão territorial, seja por sua geografia única, sua natureza ímpar; Assim,o automobilismo por lá também segue esta regra;
De lá surgiram grandes campeões como Jack Brabham,Dennis Hulme( neo-zelandês,mas que começou a carreira por lá),Alan Jones; nomes sem dúvida conhecidos do grande público por ganharem titulos mundiais de F-1;mas centenas de outros grandes pilotos não são conhecidos pelo grande publico em geral,por disputarem um campeonato restrito a terra dos cangurus: o Australian Touring Cars Championship(ATCC), e o nome de maior destaque de todas sua história é Peter Brock;



Peter Geoffrey Brock nasceu em 26 de fevereiro de 1945, sua família morava na cidade de Hurstbridge, no suburbio de Melbourne;Brock viveu nela sua vida inteira...Seu primeiro carro foi um surrado Austin Seven que adquiriu por míseros 10 Dólares Australianos ( algo perto de £5!)
O carro era terrivelmente mal conservado, não tinha freios e um pedaço da lataria fora arrancado com um machado! Mas foi o suficiente para acender a paixão pelos automóveis em Peter,: no inicio de sua carreira, competiu com o que os australianos chamam de "wild and woolly"- carros pequenos dotados de motores de maior cilindradas,adaptações feitas em pequenas oficinas e garagens; O mais famoso desses sem dúvida era o  Austin A 30 azul, equipado com um poderoso motor Holden de 6 cilindros, guiado por Brock;


O pequeno Austin A 30 com um brutal motor Holden 6 cil,pilotado por Brock

Brock pilotou BMWs,Porsches,Volvos..mas sua relação mais duradora foi com a Holden;
para a divisão australiana da GM, Brock pilotou por 40 anos; por ela, disputou o campeonato Australiano de Turismo,e sua melhor fase foi durante os anos 70;
A fase de ouro dos "aussie muscle car", com a rivalidade maior entre Holden e a Ford; com o Ford Falcon GTHO de um lado e o Holden Torana de outro, ambos com imensos motores V8; 

[O campeonato é disputado nas principais pistas australianas, algumas bem conhecidas pelos amantes de F-1, como Adelaide e Melbourne; mas o ponto alto eram os 1000 km de Bathrust;
Bathrust é uma pequena cidade em Nova Gales,uma das mais belas regiões australianas; o maior destaque de sua paisagem é o Monte Panorama; é nas estradas que o circundam que foi montado o circuito; com quase 6,4 km de extensão, tem como maiores caracteristicas, uma diferença de 150m de altura entre o ponto mais alto e o mais baixo da pista! A última curva antes da reta, a Murray, tem exatos 90° de curvatura.... decididamente não é uma pista para qualquer um; Mas era a casa de Brock, por ela ganhou o apelido de "King of Mountain", o rei da montanha]

Peter Brock formou uma dupla perfeita com o Torana, palavra que no idioma aborigene, significa, aquele que pode voar; e com seu Holden voador, era imbatível no Monte Panorama


Brock e seu Torana GTR XU em Bathrust 1972

Peter foi campeão do Australian Championship Touring  Cars em 1974,1978, e 1980 além de vice em 1973,1979,1981,1984 sempre a bordo de um Holden;
Venceu em Bathrust 1972,1975,1978,1979,1980,1982,1983,1984,1987; sendo que a prova de 1979 entrou para a história pois venceu a prova com 6 voltas de vantagem para o restante além de ter quebrado o recorde da pista.


O mítico Holden Torana AX-9 V8 usado por Brock em 1979

Brock também foi bem sucedido em provas de rally e de longa duração, tendo chegado em 2° nas 24 hs de Spa em 1977 pilotando um mediano Vauxhall Magnun;
Anunciou sua aposentadoria integral em 1997; criou a Peter Brock Foundation, destinada a ajudar crianças e jovens sem recursos, algo como o Instituto Ayrton Senna em nosso país; Brock poderia ter tido uma aposentadoria tranquila, mas a alma de piloto estava inquieta, e decidiu correr mais uma vez; volta em 2006 para pilotar uma réplica do Shelby Cobra GT, ano 2001,equipada com um motor Holden V8 em uma prova de rally no oeste australiano; foi sua derradeira prova e sua despedida deste planeta;em 8 de setembro daquele ano, faltando apenas 3 kilometros para a linha de chegada, Brock choca-se contra uma árvore e é lançado a 50 metros.... aos 61 anos, Peter Brock partiu fazendo o que mais amava,pilotar, pura e simplesmente pilotar.


O que sobrou do Daytona GT de Brock

Para finalizar, um vídeo com a volta final de Bathrust 1979, volta que Brock quebra o recorde da pista, seu até hoje; os aborígenes tinham razão: Brock realmente podia voar